sábado, 13 de novembro de 2010

Deixa Maria

Maria queria escrever uma estória doce, daquelas que enche de vida os pulmões de quem lê. Mas não encontra esse possível que em algum lugar deve existir.

Maria queria sentir o corpo inteiro pulsando de um sangue bem quente e vermelho de novo. Maria queria pular do ponto mais alto, sentindo as farpas de si soltando-se no ar. Queria sentir que o impossível estava ao alcance de suas mãos, que cada novo hoje, pudesse vir tão cheio de um mesmo que a renovasse sempre. Maria queria chorar bem alto quando o desepero viesse e queria rir até doer o peito. Abrir a boca debaxo d'água e engolir o mar inteiro. Acordar arrancando os cabelos de excitação. Sentir o gosto de sal. Queimar o medo de perder, o medo de ter, o medo de quem tem que partir, o medo de quem só pode ficar.
Maria queria sentir raiva, pena, desprezo, candura, amor quem sabe. Maria queria sentir qualquer coisa. Maria só queria a certeza de que ainda sente. Trazer a cabeça cheia de qualquer coisa, qualquer coisa.
Já que não havia raiva, nem tampouco amor, então não havia pecado e não havia perdão. Ficava um nada latejando. Não, o nada não fica nem latejando. O nada é só essa ausência. Até dela mesma. Que não se sabia.
Maria acreditava que não estava ali e forçava-se a acreditar que existia em outro lugar. Era só estender a mão e encostar.
Maria suspirava. Enchia o peito de ar e depois soltava. Esperava um vento súbito que lhe tirasse do chão. Ela que estava cada vez mais fincada na terra. Esperava que pudesse dormir e, ao acordar, alguma coisa fizesse sentido, qualquer coisa.
Ele dizia que, todos os dias ao acordar, repetia para si mesmo: "que seja doce", sete vezes seguidas. Maria já se cansava. Esta noite dormiria depois de muito tentar e, ao acordar, repetiria sete vezes seguidas: "que tenha gosto, que tenha gosto, que tenha gosto..."

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