domingo, 27 de maio de 2012

Remoto controle



Eu ando pelo mundo prestando presto atenção em cores que eu não sei o nome.

Daí paraliso e estremeço quando um vermelho súbito toma de rompante o meu dia, mancha minha semana. Espirra na cara fazendo sujeira, gritando a ofensa que só um vermelho tão inesperado, mas tão anunciado, poderia trazer. Vou limpando com calma a bagunça feita pelo vermelho, aparando as arestas de uma dor que não é minha, nem sua.

Quem é ela? Quem é ela?
Ela é o vermelho na calçada. E eu vejo tudo enquadrado.

Vou pensando devagar que o borrão vermelho vai apagar, dando lugar aos poucos a um breve azul, e logo existirão cores outras. Daí, pum, um estampido, outro vermelho, mais uma mancha. Esse mais contido. Esse logo fica roxo e cinza. E a gente fica querendo ver um pouco mais de cores outra vez.

Esqueço.
Lembro.
Esqueço.
Lembro outra vez.

Considere a real dificuldade que tenho em lidar com a linearidade do tempo. Considere que há durezas que ninguém deveria aprender. Deixa eu te dizer: meu amor, eu acordei. E havia uma multidão ao lado, cada um olhando pra um lugar diferente do outro, cada um parecendo mais perdido, outros sem sequer perceber que estavam perdidos. Considere a minha vontade (que você já flagrou antes) de levantar sorrateira e sumir da cena. Considere a minha também real dificuldade em expor fragilidades. Entenda que há dias que parecem anos embotados de solidão.

As noites têm sido cheias demais, e cada vez que acordo parece que mais um ano se passou. Tome posse disso - eu te permito essa posse por hoje – e me deixe dormir até que eu encontre sentidos outros para o que, na verdade, não faz sentido algum. Aceito ajuda pra tecer um tapete novo que se finja chão para os pés. Essa noite, o que eu queria era te dizer do menino, mas não consigo. Talvez porque ele fosse tão duro, tão opaco, tão ele mesmo, tão cheio de histórias que eu não conhecia. Eu queria dizer que ele tinha cor, mas eu não sei. Queria dizer que ele tinha voz, mas eu não sei. Queria dizer que ele tinha vida, mas ela acaba e nem isso eu sei ainda.

Eu percebo que está tudo embolado por aqui, mas considere tudo, os dias que seguem, e, por favor, entenda que essa noite eu só preciso dormir sem sonhos. Também eu não gosto do que se lê aqui, mas escrevo só pra ver se cala.

Você sabia que a história acabava assim, não sabia? Só não queria dizer. Eu sabia também. Mas, pra não sair da rotina, eu preferia não saber.